sábado, 11 de abril de 2015

Conservação da biodiversidade em paisagens fragmentadas

Tradicionalmente há a preferência por grandes fragmentos como base para a conservação da biodiversidade. Isto é justificado, basicamente, por duas razões: a teoria da biogeografia de ilhas e o efeito de borda.

A teoria da biogeografia de ilhas afirma que ilhas maiores e mais próximas do continente são preferíveis para a conservação da biodiversidade porque ilhas maiores apresentam maiores nichos ecológicos, consequentemente menores taxas de extinção, e ilhas mais próximas dos continentes apresentam maior taxa de imigração, que é o principal meio de equilíbrio com a extinção. Esta teoria tem servido como base para estudos de conservação da biodiversidade, nos quais os fragmentos florestais sofrem analogias com as ilhas. Porém há algumas falhas na aplicação desta teoria. Primeiro, esta assume que existe uma fonte constante de espécies para suprir os efeitos negativos da extinção, neste caso o continente. Porém nem sempre isso é verdade para os fragmentos florestais. Algumas vezes tais fontes não existem ou o fragmento apresenta um grau de isolamento tal que impossibilita a imigração de espécies. Segundo, a teoria da biogeografia de ilhas supõe uma barreira que isole ou mesmo proteja estas, neste caso a água. Os fragmentos florestais geralmente não são tão isolados quanto as ilhas, sofrendo profundas influências da matriz na qual estão inseridos.

Figura 1: Taxa de renovação de espécies em diferentes equilíbrios. (Fonte: MacArthur, 1972).

A figura 1 mostra uma comparação entre a riqueza de espécies entre diferentes cenários propostos pela teoria da biogeografia de ilhas. De acordo com esta teoria a classificação de ilhas quanto à riqueza de espécies, em ordem decrescente, seria: ilhas grandes e próximas ao continente, ilhas pequenas e próximas ao continente, ilhas grandes e distantes do continente, ilhas pequenas e distantes do continente. Percebe-se que a proximidade do continente possui maior peso na riqueza de espécies que o tamanho da ilha.
O efeito de borda é a denominação da influência, geralmente negativa, que a matriz exerce sobre os fragmentos florestais. A área de borda destes fragmentos é uma área de transição entre o ambiente do interior do mesmo e do meio externo, sendo então não conveniente para a conservação da biodiversidade. Para reduzir este efeito são então preferíveis fragmentos com o formato mais circular possível e de maiores tamanhos. Isto porque um fragmento de área X possui menos borda que outros tantos fragmentos cujas áreas somadas sejam a mesma que a sua. Isto é exemplificado na figura 02, que mostra dois cenários de fragmentação florestal. No primeiro é gerado apenas um fragmento, enquanto que no segundo são gerados quatro fragmentos florestais.

Figura 2: Exemplos de fragmentação florestal. (Fonte: Tyler, 2005).


Para contornar principalmente os pontos negativos da abordagem tradicional da aplicação da teoria da biogeografia de ilhas, os novos estudos sobre conservação da biodiversidade têm considerado cada vez mais a importância de pequenos fragmentos florestais. Esta nova abordagem se apoia principalmente na ecologia de paisagens e teoria das metapopulações. Estas dão importância à conceitos ignorados pela teoria da biogeografia de ilhas tais como: presença e ausência de espécies em fragmentos, conectividade entre fragmentos, interações entre os fragmentos e a matriz. Um exemplo de tais interações é mostrado na figura 3. Esta teoria assume que a biodiversidade será melhor conservada se presente em um maior número de fragmentos, pois através da conectividade entre os mesmos, caso alguma catástrofe ocorra e leve à extinção de uma espécie em um fragmento, a mesma poderá recolonizar este a partir de outros. Também prevê maior diversidade genética nas espécies. O importante, segundo esta nova abordagem, não é apenas reunir a maior área possível como ponto de partida para a conservação; é evitar que as pequenas áreas sejam totalmente isoladas. Todavia, devido às consequencias negativas do efeito de borda, é interessante que haja um meio termo entre os dois paradigmas citados.

Figura 3: Exemplo de conectividade entre fragmentos florestais e interações entre os mesmos e a matriz ambiental. (Fonte: Tyler, 2005)

Recentemente muitos trabalhos têm destacado a importância que uma vez foi negada aos pequenos fragmentos florestais no âmbito da conservação da biodiversidade. Viana e Pinheiro (1998) destacaram alguns pontos muito importantes, a saber:

  • A maior parte da biodiversidade se encontra em pequenos fragmentos florestais.
  • No melhor dos cenários, parques e reservas responderão pela manutenção de apenas 10% da cobertura natural dos ecossistemas naturais.
  • A correlação entre a área dos fragmentos e o número de espécies não é trivial: é mais complexa do que a postulada pela teoria da biogeografia de ilhas.
  • A degradação nem sempre é relacionada apenas com a redução da área de um fragmento florestal. Muitas vezes,  a área permanece a mesma. O que se reduz é o número de espécies neste fragmento.


Referências

MACARTHUR, R. H. Geographical ecology. Harper and Row. New York, 1972.

TYLER, M. G. Living in the enviroment. Thomson Brooks/Cole. Pacific Grove, CA, 2005.

VIANA, V. M. PINHEIRO, L. A. V. Conservação da biodiversidade em fragmentos florestais. Série técnica IPEF. v.12, n. 32, p.25-42. São Paulo, dezembro de 1998.